sábado, 18 de julho de 2009
Candomblé e Umbanda são declarados patrimônios imateriais no RJ
O candomblé foi declarado patrimônio imaterial do Estado do Rio de Janeiro. A lei foi sancionada pelo governador em exercício Luiz Fernando de Souza Pezão e publicada ontem no Diário Oficial. O projeto foi proposto pelo deputado Gilberto Palmares (PT). O mesmo projeto para a umbanda já foi aprovado pela Alerj e aguarda sanção do governador.
A Comissão de Combate à Intolerância Religiosa comemorou a notícia nesta sexta. Para Jorge Mattoso, secretário da comissão, a lei vai ajudar a diminuir o preconceito.
- Para a gente foi muito importante. Vai significar um resgate da auto-estima e elevar o respeito frente a atos de intolerância religiosa. Isso vai abrir portas, pois vamos poder fechar convênios com várias entidades.
Mattoso espera que a lei estadual ajude na aprovação de uma lei federal. A comissão fez um encaminhamento do pedido, durante a 2ª Conferência de Igualdade Racial, realizada em junho, em Brasília.
segunda-feira, 13 de julho de 2009
Os guardiões incompreendidos - Douglas Fersan
Provavelmente uma das manifestações divinas mais difíceis de se entender é a dualidade. O pensamento ocidental, maniqueísta, calcado em valores cristãos – devidamente distorcidos de acordo com interesses políticos e econômicos ao longo da História – estabeleceu um padrão de pensamento em que existem duas forças antagônicas: o bem e o mal, sempre em constante batalha pelo domínio do mundo e da alma de seus habitantes. Assim, tudo que não segue a estética e a moral ocidental-cristã é imediatamente associado à sua antítese: as forças maléficas regidas por seres do mal, chamado de demônios.
Esse tipo de pensamento traz em si um paradoxo, já que o próprio livro sagrado do Cristianismo afirma que Deus é onipresente. Estando em todas as partes, Deus estaria também nas regiões trevosas da espiritualidade – regiões que muitos tomaram por costume chamar de inferno.
Então Deus estaria no inferno? Parece uma heresia total fazer tal afirmação, mas sendo Ele um ser onipresente, deve (ou deveria) estar em todos os lugares.
A crença de um inferno de penas eternas e governado por um ser excepcionalmente maldoso também faz parte do imaginário cristão e, dentro desse raciocínio contraditório, não haveria lugar para Deus nessa região – mesmo sendo Ele onipresente (?).
Dentro da filosofia que norteia o pensamento umbandista, descartamos essa idéia de inferno. Admitimos a existência de regiões espirituais trevosas, densas, onde se encontram aqueles espíritos que não atingiram a elevação moral esperada, elevação essa que pode ser conquistada um dia, não necessariamente através de expiações, mas também do trabalho árduo na espiritualidade. No entanto, nessas regiões ainda reina uma espécie de barbárie espiritual, já que os valores morais de seus habitantes não são os mais elevados, necessitando assim de alguém que controle suas ações, não permitindo que outras esferas (como a dos encarnados, por exemplo) sejam alvos dos ataques e obsessão desses espíritos. É nesse contexto que começamos a entender o papel dos Exus, os guardiões tão incompreendidos e injustiçados, que atuam como agentes da Lei e da Ordem dentro desse princípio da dualidade divina. Entender Exu é entender o próprio funcionamento da Lei Maior.
Antes de qualquer coisa é preciso saber a diferença entre o Orixá Exu e o Exu catiço, da Umbanda. A palavra Exu, que significa “Esfera”, remete aos cultos africanos e ao Orixá de mesmo nome. Como bem sabemos, por diversos fatores históricos, houve no Brasil um processo chamado sincretismo, através do qual as divindades africanas foram associadas aos santos católicos. Assim, Iansã, por exemplo, que é a divindade dos raios e das tempestades, foi sincretizada com Santa Bárbara, já que essa santa também é associada aos raios e trovões. Ogum, o Orixá guerreiro, foi sincretizado com São Jorge, o patrono militar dos católicos, e assim por diante. No entanto, com o Orixá Exu houve, ainda dentro do sincretismo, um processo de demonização. Sendo Exu a divindade ligada à fertilidade, à sexulidade e à virilidade – inclusive carregando, em suas representações, um cetro em forma de falo – e tendo uma personalidade um tanto rebelde, como nos contam as itans (lendas africanas dos Orixás), não tardou para que fosse associado ao demônio bíblico/católico. Assim, desde o princípio, Exu foi temido, e provavelmente gostou disso, levando-se em conta seu caráter irreverente.
Apesar da confusão em torno da natureza de Exu, não podemos esquecer e nem desprezar sua importância dentro do panteão africano e de seu funcionamento, já que ele atua como “mensageiro” ou “intermediário” entre os homens e os Orixás.
Nos cultos de Umbanda também encontramos Exu, porém não na figura de um Orixá, e sim de um espírito catiço, um desencarnado, que viveu em Terra e procura, através do trabalho na espiritualidade, alcançar o progresso moral.
Também associado a figuras demoníacas, o Exu da Umbanda é um valoroso trabalhador, que indiferente a essas interpretações calcadas em visões preconceituosas, segue perseverante no cumprimento de sua tarefa.
O papel do Exu numa gira de Umbanda é de fundamental importância, realizando a segurança do terreiro – imaginem quantos kiumbas (espíritos trevosos e zombeteiros) atacariam uma tenda de Umbanda a fim de atrapalhar seus trabalhos, se não fosse a presença dos Exus, trancando a sua passagem. Em casos de descarregos, também são os Exus os principais agentes, pois cabe a eles a tarefa de encaminhar cada espírito, seja um pobre sofredor desorientado, ou um perigoso obsessor ao seu local de merecimento e/ou tratamento.
Exu também é o agente da justiça kármica, sendo sua tarefa levar a cada um o que lhe é de direito ou merecimento – por isso também a confusão em torno de seu caráter, já que ao coração humano é muito fácil aceitar o que é agradável, mas muito difícil entender que os revezes da vida muitas vezes são resultado de nossas próprias ações.
Ao contrário daquilo que falam sobre eles, os Exu são fiéis amigos, sempre dispostos a ajudar seus protegidos, mas também exigindo uma conduta deles, pois são extremamente rigorosos.
De uma forma bastante simplificada, podemos entender o Exu como uma mistura entre o carteiro e o gari, pois ele traz aquilo que deve ser entregue e varre aquilo que deve ser levado.
sexta-feira, 3 de julho de 2009
A Umbanda não é popular - Douglas Fersan
A palavra “popular” pode ter duas interpretações. A primeira delas refere-se a algo ligado a pessoas humildes, do povo e até – sem querer, em hipótese alguma, demonstrar algum tipo de preconceito social – a pessoas de pouca instrução formal. Outra interpretação que pode ser dada à palavra “popular” é aquela que se refere aos fenômenos de massa. Nesse caso, a Umbanda não é popular.
Longe de ser elitista, pois bem sabemos que não é o caso, a Umbanda não é popular no sentido de abranger e mobilizar grandes massas. Populares são as religiões neopentecostais, como a Universal do Reino de Deus ou a Renascer em Cristo, por exemplo. Essas sim, são populares, atingem grandes públicos, mobilizam multidões e lotam estádios a um simples chamado de seus líderes (e que isso não seja entendido como uma crítica, ao contrário, é um fator positivo dessas religiões, deixando juízo de valores de lado).
A Umbanda mobiliza suas multidões em datas específicas, como as festividades a Iemanjá, como as ocorridas nos municípios de Praia Grande e Mongaguá, mas que na verdade trata-se da reunião de diversos micro-universos umbandistas, utilizando apenas a mesma data e local para seus cultos, na maior parte das vezes, diversificados. Nas demais datas, o que se vê são alguns terreiros lotados de pessoas em busca de curas ou soluções para seus problemas materiais – pessoas essas que em sua maior parte não retornarão após solucionadas suas questões – ou pequenos templos improvisados, onde irmãos-de-fé movidos a boa vontade arrastam alguns móveis a fim de abrir espaço para atender alguns poucos necessitados que os procuram – e que dificilmente também retornarão após a solução de seus problemas.
A Umbanda é popular no sentido de ter nascido e sobrevivido dentro das camadas mais humildes da população, mas está longe de ser um fenômeno de popularidade. Seria mais correto então, afirmar que a Umbanda, além de um caminho, uma religião e uma filosofia de vida, é também um movimento de resistência, pois mantém viva a tradição, a história e a luta de um povo miscigenado, que não se entregou e não abriu mão de suas raízes.
A Umbanda é perfeita. Tão perfeita que abriga em seu seio as mais variadas vertentes espiritualistas e os mais diversos segmentos sociais, pois na dor todos se igualam, e na busca da solução de seus problemas, orgulhos desmoronam como castelos de areia e doutores, mestres e PHD’s dobram-se à sabedoria e à simplicidade de um preto velho sentado em um banquinho.
A Umbanda não precisa ser popular. Ela precisa ser aprendida, vivenciada e assimilada por aqueles que a praticam. E precisa ser respeitada por aqueles que não a praticam e a desconhecem. Para isso, a Umbanda não precisa ser popular, ela precisa ser desmistificada e exemplificada pelos seus filhos, que tantas vezes agem como pródigos ou adolescentes rebeldes, esquecendo os ensinamentos daquela que os ampara.
A Umbanda é séria e por vezes severa, mas é mãe, e como tal, acolhe seus filhos, mesmo os mais rebeldes.
A Umbanda não é popular, mas é do povo.
É a Umbanda, e isso basta.
Douglas Fersan
Julho de 2009
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