segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

O maior inimigo da Umbanda - por Douglas Fersan



O fato de que religiões como a Umbanda, o Catimbó, o Batuque e o Candomblé são alvos constantes de perseguições e calúnias não é novidade para ninguém. Tal situação nos coloca numa posição quase sempre defensiva perante a incipiente “ameaça” de um ataque à nossa crença. E os ataques não são raros, acontecem das mais variadas formas: através da mídia eletrônica, que não poupa subterfúgios (como classificar os sacerdotes dos nossos cultos de “pai ou mãe-de-encosto”, e assim fugir à responsabilidade criminal das agressões que proferem) e até mesmo nos púlpitos de algumas denominações religiosas, que no lugar de primar pelo respeito e pela convivência pacífica, preferem incitar a fúria da intolerância contra as religiões que desconhecem e, por desconhecer, julgam mal.
É triste ver a Umbanda ser difamada, denegrida e exposta de maneira tão negativa. No entanto, vale lembrar que existem leis que nos amparam e garantem o respeito ao nosso culto, sua liturgia e seus símbolos. Lembro até que durante um seminário que realizamos na Câmara Municipal de São Paulo, em novembro de 2009, o sacerdote Alexandre Cumino expôs, de forma muito brilhante (a ponto de me fazer recordar de sua explanação até hoje), que na verdade não temos a necessidade de ficar reivindicando leis que amparem a nossa liberdade de culto, posto que essas leis já existem. O que nos cabe é fazer com que elas sejam colocadas em prática de forma eficiente e incisiva. Embora o senso comum tente ocultar esse fato, a legislação brasileira, no que se refere à liberdade religiosa, beira à perfeição. A falha encontra-se naqueles que não a respeitam ou àqueles que quando são desrespeitados, não acionam a lei, fazendo valer seus direitos e os dos seus irmãos-de-fé.
Dessa forma, é possível combater de frente a intolerância e os intolerantes, inimigos declarados da Umbanda. Eles não me assustam tanto quanto aqueles que agem de forma velada, na calada da noite.
Me assustam os postes emporcalhados com as promessas de trazer o amor de volta em poucos dias, assim como as propagandas de serviços como amarração e similares. Ao leigo todos são iguais: umbandistas que realmente zelam pelo nome de sua crença e esses charlatões são colocados todos no mesmo caldeirão, sem que se faça a justa distinção do joio e do trigo. Essa é uma prática que só alimenta o ódio e o desrespeito, fornecendo munição aos detratores da nossa religião.
Mas também não são esses os que mais me assustam, pois mesmo ao leigo basta um pouco de esforço para perceber que são charlatões declarados. Acredito que quanto mais sutil, mais perigoso é o inimigo.
Muito me assusta aquele “umbandista” de voz doce e conversa amiga, que fala em nome da caridade e dos orixás. Aquele que veste branco, mas que tem a alma fétida e os pensamentos poluídos, apesar do sorriso fácil. Aquele que inspira confiança, que se vale do momento de carência ou desespero do consulente para tirar proveito da situação, seja esse proveito financeiro ou mesmo para enaltecer seu ego faraônico. Aquele que toma a frente de suas entidades (se é que as tem) ou mistifica descaradamente para falar aquilo que “a paisana” não teria coragem e hombridade para dizer. Aquele que usa o nome da sua religião e de suas supostas entidades para amedrontar seus desafetos. Aquele que se desagrada profundamente com o crescimento alheio, que conspurca seu templo com a sua mesquinharia e que, no lugar de honrar a sua roupa branca, a deixa impregnada com as máculas da maledicência, da inveja, da mentira e principalmente do abuso da boa fé dos incautos que o procuram em momentos de dor.
O maior inimigo da Umbanda está infiltrado em seu seio. Como um vírus mutante, é difícil ser combatido, pois imuniza-se tão facilmente quanto desvia seu caráter. Esse inimigo da Umbanda é perigoso, pois não é declarado e muitos umbandistas não o enxergam a tempo. É despreparado para receber em seu ori a energia dos sagrados orixás. É indigno de emanar a pureza das crianças, já que não a possui minimamente. Não tem condições de encarnar a bravura dos caboclos ou a sabedoria humilde dos pretos-velhos, pois em sua existência ainda não desenvolveu tais virtudes. É um umbandista de fachada, que não compreende o real significado da sagrada Umbanda, que ainda não se despiu das suas imperfeições mais grotescas para adentrar um terreiro e participar de uma gira.
Esse é o inimigo mais perigoso.
Dolorosamente é possível concluir que o maior inimigo da Umbanda é o umbandista – não me refiro aqui ao umbandista que honra e ama a sua religião, mas àquele que se traveste de umbandista, algumas vezes por ser mal intencionado mesmo, outras, por ser desprovido de inteligência para compreender o que vem fazendo de sua própria existência carnal e espiritual.
É esse que mais me impressiona, embora não me amedronte, pois para cada um desses, existem outros tantos sinceros, desinteressados, dispostos a praticar a real caridade, a contribuir para a própria evolução e daqueles que o procuram. Esses honram a nossa amada Umbanda e fazem todo sacrifício valer a pena.
Pelos outros, rezemos...

Douglas Fersan – fevereiro de 2011.