terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Saudade - Douglas Fersan

Hoje eu senti saudade...
Saudade de um tempo em que as maiores dores eram os joelhos ralados e as maiores preocupações eram as notas baixas em matemática, o que poderiam fazer com que eu não ganhasse um bom presente de natal.
Senti saudade das árvores que eu escalava, não para pegar frutas, mas para me sentir nas alturas. Era uma forma de poder estar acima do solo e das cabeças dos outros, enxergando onde outros não enxergavam.
Senti saudade dos sonhos, que pareciam tão distantes: voar, comer um pote inteiro de sorvete, ter uma bola de capotão só para ser o dono do jogo e decidir quem ia participar da brincadeira ou não.
Hoje as saudades são outras.
Saudades das pessoas que Deus já chamou: meus pais, tios, amigos - alguns que foram tão cedo que se não fosse a fé, eu não saberia como explicar a vida (ou o fim dela) sem me revoltar.
Saudades das antigas preocupações, pois hoje as notas que preocupam não são as de matemáticas. São as notas promissórias que estão para vencer, são as notas que saem no jornal falando de extremistas (de todos os lados e credos) dispostos a explodir a si mesmos e aos demais por razões que parecem não ter razão alguma.
Tenho saudades das árvores. Não para escalar, já não tenho idade para isso, mas pelo menos para que façam uma sombra nesses dias de calor intenso. Parece que nem todos tinham esse carinho por elas. Acho que os donos do dinheiro e do poder não tiveram a mesma oportunidade que eu tive, de subir em árvores, pois hoje as derrubam sem o menor pudor, não se importando se seus filhos e netos terão árvores para escalar. Ou mesmo se terão a sombra de uma árvore... ou mais ainda, se terão ar para respirar.
Tenho saudade dos meus desejos de poder, pois hoje não o quero mais. Não quero ser detentor do poder, mas quero que os donos dele sejam humanos e justos ao escolher o papel que cada um vai desempenhar no jogo da vida.
Só não tenho saudade dos meus sonhos, pois não perdi a fé - aliás, com o tempo ela só se fortaleceu. E enquanto tiver fé, irei sonhar e ensinarei outros, mais jovens, a sonhar também, para que quando chegarem à minha idade não desistam passivamente dos seus sonhos e nem tenham saudade deles, pois lutarão bravamente para que sejam realizados. Quem tem fé tem sonhos. Quem sonha não morre jamais, pois planta nos mais jovens a semente que florescerá para todo o sempre, impedindo que o nosso planeta azul se torne um planeta de concreto.
Douglas Fersan
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